quarta-feira, 17 de abril de 2013

Uma história mal contada


Edição Impressa - Edição 615 de 14/04/2013 Uma história mal contada
 Publicação: domingo, 14 de abril de 2013
http://www.focoregional.com.br/v2/page/impnoticiasdtl.asp?t=UMA+HIST%D3RIA+MAL+CONTADA&idnoticia=23944

Os moradores do Conjunto Habitacional Volta Grande IV, em Volta Redonda, estão assistindo de olhos abertos a um pesadelo que não tem data marcada para acabar. Na semana passada, o condomínio residencial construído no fim da década de 1990 pelo Sindicato dos Metalúrgicos, em terreno que serviu de depósito de resíduos da produção de aço da CSN, virou tema de reportagens de veículos de comunicação de todo o país, depois que o secretário estadual do Ambiente, Carlos Minc, confirmou que a área está contaminada por substâncias tóxicas e que as famílias precisarão ser removidas. O terreno foi doado à CSN para a construção de 750 casas, onde vivem cerca de 2,1 mil famílias.

Numa entrevista no Rio, depois de divulgar que a CSN será multada em R$ 35 milhões por ceder uma área contaminada para a construção das casas, o secretário – conhecido por seu incontrolável desejo de aparecer na mídia – deu uma série de declarações que instalou pânico entre os moradores. Afirmou que foi dado à siderúrgica prazo de sete dias para apresentação de um cronograma de análises das condições de saúde de 220 famílias; de 15 para apresentação de um plano e início da realocação das famílias; e de 30 dias para apresentação de um plano para descontaminação do solo e do lençol freático do terreno de 10 mil metros quadrados onde o condomínio foi construído.

Da forma como o secretário tratou do assunto, a impressão que causou foi a de que nos próximos dias teria início no bairro uma grande operação de transferência de moradores – se vier a acontecer, é bom que se diga, não será da noite para o dia como as afirmações de Minc sugeriram. Ele afirmou que as medidas foram determinadas a partir de um novo laudo do Inea (Instituto Estadual do Ambiente) sobre o conjunto habitacional. Balela. Não há laudo novo nenhum. O que ocorreu, na verdade, foi uma nova opinião do Inea sobre estudos feitos por empresas contratadas pela própria CSN. Curiosamente, o Inea mudou seu ponto de vista depois que o juiz da 3ª Vara Cível de Volta Redonda, Cláudio Gonçalves, mandou incluir o instituto e a prefeitura na ação civil pública que o Ministério Público Estadual move contra a companhia pela cessão do terreno.

Em fevereiro deste ano, o juiz negou liminar de tutela antecipada pedida pelo MP para desocupar uma parte da área. Em sua sentença, o magistrado observou que a necessidade de realocação dos moradores foi defendida apenas pelo Gate, um grupo de apoio técnico à promotoria. Ou seja, até então, o Inea não considerava tal necessidade. "O Inea havia se manifestado que não havia necessidade de remoção dos moradores, somente a remediação do solo, com a impermeabilização das áreas expostas", confirma o advogado Igor Alexei Castro, do escritório Pedro Alves, que atende a comissão de moradores. Ele lembra que, para se fazer a remoção, terá de haver determinação da Justiça.

As declarações do secretário estadual do Ambiente não repercutiram mal apenas entre as famílias do bairro. Na prefeitura, a forma como Minc expôs a questão também foi condenada. O deputado federal Deley de Oliveira (PSC) conseguiu, depois de várias tentativas, que o secretário recebesse a comissão de moradores do bairro, o que aconteceu na quinta-feira (11). Na conversa, tendo ao seu lado a presidente do Inea, Marilene Ramos, o midiático Minc acabou tocando no ponto ao qual a CSN se apega para empurrar o problema com a barriga até onde for possível.

Disse, segundo informações distribuídas por sua assessoria de imprensa, que a multa à CSN não foi de R$ 50 milhões, como ele mesmo calculara anteriormente, "porque ainda não foi comprovada por laudo a contaminação de famílias". Segundo Minc, "assim que alguma família apresentar comprovação de contaminação, o valor da multa será revisto para cima". E acrescentou: "Não podemos dizer que as pessoas estão doentes. O que sabemos é que elas foram expostas a substâncias tóxicas". Ou seja, de novo mesmo, não há nada.

Fiocruz manda equipe à cidade

A única coisa positiva causada pelas declarações de Carlos Minc foi que as autoridades do município se mobilizaram para tentar saber se o fato de estarem morando sobre um terreno que recebeu material tóxico afetou ou não sua saúde. Na quinta-feira (18) é aguardada em Volta Redonda uma equipe da Fiocruz, que vai se reunir às 13 horas com a Secretaria de Saúde para definir uma linha de ação neste sentido.

Tudo indica, porém, que será uma missão complexa definir quem adoeceu em razão da área habitada. "A Fiocruz é que traçará a linha de ação", disse a secretária Suely Pinto, admitindo, em resposta ao FOCO REGIONAL, que não tem ideia dos exames que serão feitos. Na equipe virá um toxicologista, profissional inexistente nos quadros do município. Segundo Suely, dados coletados pelo município em 2004 serão desconsiderados. "Faremos tudo de novo", informou.

O prefeito Antônio Francisco Neto, que na sexta-feira recebeu a comissão de moradores juntamente com o deputado Deley de Oliveira (PSC) e os vereadores José Jerônimo e Emilson Sukinho (PSD), que compõem a comissão formada na Câmara, afirmou que pretende buscar entendimento com a CSN e com o Sindicato dos Metalúrgicos caso fique confirmado que há casos de doença na Volta Grande IV relacionados com a contaminação do terreno. "Até agora não houve comprovação de que isso aconteceu, não houve uma conclusão segura", disse ele, que chegou a ser cobrado por uma ex-moradora pelo fato de nenhuma providência ter sido tomada desde que as suspeitas vieram à tona, no início dos anos 2000.

De parte da CSN foram emitidas, na semana passada, duas notas. Na primeira, a empresa informava que ainda não tinha sido notificada da multa de R$ 35 milhões (a notificação ocorreu na quarta-feira), que discordava e recorreria do procedimento. Em outra, sobre a declarações de Minc, a empresa não diz claramente, mas deixa evidenciado que continuará resistindo na Justiça para não ter que bancar a realocação dos moradores e a indenização dos que vierem a ser mesmo obrigados a sair.

Disse a companhia em nota que, em 2000, com o bairro já consolidado, iniciou em conjunto com os órgãos ambientais uma série de pesquisas sobre a caracterização e o uso do solo. Segundo a empresa, o último estudo, feito por "renomada empresa norte-americana", concluído em 2012, é taxativo ao declarar que: "para área de uso residencial é possível afirmar que, com base nos dados ressaltados no presente parecer, inexistem situações de perigo ou risco iminente relacionados às concentrações dos compostos químicos de interesse detectados".



Divulgação

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